sábado, setembro 24, 2011

Era um dia de domingo

[Caminhada Varginha a fazenda Ypê]

Típica manhã primaveril; sol dourado invadindo os canteiros do jardim ou mais de lá refletindo o amarelo-ouro das dálias se abrindo, tantas do galho se entortar, e também as moças-e-velhas e as rosas de matizes variadas, atraindo as abelhas, as mangangás. E essas voejavam de uma flor à outra, virtuosas, sugando o néctar – em inconfundíveis zumbidos que mais lembrava um concerto musical.  
Angélica não precisava olhar além do jardim, uma vez que se bastava ali, nas lembranças dele; desde sua partida, um ano atrás.
Dílson Inácio plantara as flores e as regava e adubava com regularidade, modo o inverno não as maltratasse tanto; e que elas melhor florissem na primavera, ele dissera, naquela ocasião.
Um ano se passara.
As lágrimas corriam-lhe dos olhos. O beija-flor, seu visitante habitual, pareceu muito agitado naquela manhã: entrou duas vezes por sua janela, voou pelo quarto, saiu pela porta da sala e se foi.
Angélica não sabia por quê?
O que sabia, o que o seu coração tinha absoluta certeza, é que jamais se esquecera daquele moço que um dia aparecera por ali, fizeram amor, ele cuidou do seu quintal, e um dia partiu. Enterrada no canteiro do jardim havia uma flor que se abriria na primavera, para colorir mais os olhos dela; ele dissera, naquele dia, quando cuidava dos canteiros e ela veio à janela vê-lo trabalhar; era um dia de domingo.
Desde então, esperava por esse dia – o dia em que a dália se abriria.
Passados reles momentos o beija-flor voltou, deu várias voltas pelo quarto, mas não foi embora: pousou ali, sobre o galho da flor, de frente a sua janela. Os raios solares daquela manhã acentuavam a peculiar iridescência do beija-flor, como ela nunca vira antes – era o verde da esperança.
Momento exato em que a campainha tocou e o coração bateu-lhe forte no peito. Correu a abrir a porta, podia ser ele, ou não – fosse apenas o seu imenso desejo de que ele retornasse. Para sua felicidade, era Dílson Inácio sorrindo, trazendo em mãos uma dália e a mala de viagem – ele vinha pra ficar; era isso o que o beija-flor queria lhe dizer.
Antes de partir, naquela vez, ele cuidara de levar e plantar no seu jardim um dos muitos tubérculos dá dália, que plantara no jardim dela. As plantas entrariam em inflorescência simultaneamente, apesar da enorme distância que as separava. Teve saudades. Assim, ele voltou aos braços dela, definitivamente. O beija-flor sabia.
Era um dia de domingo.

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