Moinho
Na face morena os olhos negros carregados de brilho e a pele sardenta, tanto quanto ele imaginava fossem infinitas as sardas daquele corpinho esguio e cheio de graça , onde se perdia – com o seu olhar de menino-moço.
Ela maliciosa; queria a toda pompa , atraí-lo; o que não era tão difícil, era antes um fascínio , aquele sorriso encantador sobejando-lhe o íntimo .
Devaneava-se, esperançoso .
O coração batia-lhe forte ; mais menino que moço . Ela , já mocinha . À noite , na cozinha , sua mãe arrebentava pipocas numa grande panela . O calor do fogão de lenha era como as labaredas saindo daqueles olhos fulminantes; que colidiam nos seus.
Comiam pipocas e se comiam de olhos, entre os olhares distraídos dos demais . Melhor nunca ter ido lá – falava pra si mesmo – porém, mais desejado ela não fosse sua parenta; mas era...
O casarão exibia-se imponente sobre o morro . Ao redor do quintal , via-se o milharal e lá embaixo o dourado dos cachos de arroz refletindo à luz do sol . Do costado da serra descia um riacho – silenciado pelos ruídos do dia e mais murmuroso ao cair da noite –, como se as águas acordassem, quando todos fossem dormir . .
O sossego da noite trazia-lhe o enternecer do ruído de um moinho lá fora ; e ele não conseguia dormir, i maginava-a no quarto ao lado ; apenas uma parede que , malicioso ele escalava, no pensamento .
Os cães latiam no terreiro. O relógio de parede , a cada instante , lembrava a sua insônia – como seria fugir com ela, pensava, ou antes , depressa , fugisse dela. Nunca mais voltasse ali , naquele casarão alto e misterioso.
O murmúrio do moinho impunha volição à sua alma ; no moinho os giros da mó , não paravam. Sentia-se como o próprio milho lá na moenda , se tornando fubá – os anseios da mente o esmiuçando, como se o transformasse em pó.
O coração o aconselhava a nunca mais voltar ali. Mas qual o quê , nas férias , estava lá ; e ela , cada vez mais bonita : os seios lúbricos , os lábios grossos , o corpo já de moça-feita; o brilho dos olhos cada vez mais intensos , acolhendo os seus .
O milho assado , recém-saído do borralho .
O lugar , o casarão e o moinho compunham-se com ela uma grandeza imensurável de sonhos ; sonhos , que ele construíra para si , ingenuamente, naquele início de adolescência . Antes um pouco, de ir embora.
O tempo passou.
Voltou ao mesmo lugar. Lembrava o dia em que fora lá pela última vez: ela estava noiva . Casaria naquele mês ; espojar-se-ia; desencantou-se. Mas os olhos dela, em vez do brilho , marejavam lágrimas – talvez ela não quisesse casar-se; talvez...
O lugar já não era mais o mesmo . Nem ele tampouco era o adolescente de antes. O casarão se desmoronara; agora, erguida no local uma simples casinha. E não havia mais roça de milho ; muito menos , arrozal . Somente uma relva bisonha e bois pastando – as garças aos arredores , na esperança do desjejum.
As águas do riacho corriam à toa – passando a revelia pelo que sobrara do moinho; era como , se envelhecido, as paredes caindo, a moenda enferrujada, o moinho nem mesmo quisesse estar ali – fosse apenas o testemunho de um tempo – já há muito existido!
No entanto , havia a impressão de ainda ressoar longínquo e desolador o moinho; t anto quanto badalava triste , na sua memória , o relógio de parede do casarão .
Soube então que ela se fora definitivamente , para o céu . Onde há uma estrela de olhos negros , procurando os seus .
Beleza! Sinto não ter lido logo seus textos O que consola é saber que eles aquí. Logo volto para mais me deliciar.
ResponderExcluirValeu! Abs
Belvedere
Beleza! Sinto não ter lido logo seus textos O que consola é saber que eles ficarão aquí. Logo volto para mais me deliciar.
ResponderExcluirValeu! Abs
Belvedere