sábado, novembro 12, 2011

Olhou-o nos olhos, não sabendo ainda se com raiva ou já açodada; bonito o danado era!

Pela mais pura necessidade

Aquele moreno lindo emparelhou-se a ela, abraçando-a por debaixo do casaco, e disse-lhe sorrindo – Continue andando, meu bem, como se não fosse nada. Tenho um punhal apontado no seu baço. Agora, se vou usá-lo ou não, vai depender... Finja que somos namorados e estamos indo, alegremente, para o shopping.

As ruas repletas de gente. Manteve o breve sorriso no rosto, descontraído, falando – E se algum conhecido ou conhecida cumprimentá-la finja que não viu; estava distraída! E entre na primeira cabine do banco que vamos sacar um dinheirinho pro Motel. – Se deu mal, malandro, estou zerada, pensou ela, no silêncio de quem ia ver no que daria aquilo...

Olhou-o nos olhos, não sabendo ainda se com raiva ou já açodada; bonito o danado era!  Motel era lugar que há muito não ia. Homem igual aquele, o braço musculoso enlaçado a sua cintura, só o namorado que trabalhava em outra cidade e há muito não vinha. 

Agora, levar um furo no baço, por conta de um orgulhinho de nada; isto, não lhe convinha! Período da ovulação, os hormônios à flor da pele, deixou-se levar...

Suspirava fundo, transpirava. Tinha muitos motivos para que isso acontecesse – o mormaço da tarde, aquele espécime másculo com o frio aço calcado no seu flanco esquerdo e, além disso, os hormônios – que esses, ele não podia imaginar; mas fosse mesmo experiente notaria, captaria suas necessidades.

Por isso mesmo saiu de casa com apenas uma batinha solta sobre os seios nus. A saia longa de seda chinesa transparente delineando o contorno de suas coxas, as sandálias de tiras combinando. E mais a correntinha folheada a ouro em torno dos tornozelos.

A calcinha assim, um tiquinho de nada, apertadinha, apertadinha.

O namorado telefonara de manhã dizendo que não viria naquele fim de semana. Mas o que isso importava? Vindo, não fazia a menor diferença mesmo – não comparecia!

Plena sexta-feira. Dinheiro no Banco não tinha. Somente um restolho do salário passado. Nas finanças remediava, no amor, faltava – uma aflição dos diabos lhe batera naquela madrugada.

Agora, aquele ali, bonitão, surgiu de repente. Mas se contentasse com o dinheirinho do Motel. Até aí morreu, Tadeu! Se eu arrisco, eu petisco – soletrava ela com os seus neurônios já despertos.

Entrou na cabine, ele junto, e para melhor se passarem por namorados, ele beijou-lhe o pescoço, longamente, somente com o calor dos lábios – Malvado! Desgraçado! – dizia-se, no intimo! Arrepiou-se da cabeça aos pés, embora não quisesse. Mas era impossível não reagir àquele fungando no cangote.

De modo ele perceber suas minguadas finanças, arriscou na tela um valor maior, sem que ele notasse, e a maquina respondeu – Fundo insuficiente!  Ele franziu a testa. Na terceira tentativa saíram os últimos trocados. Aí ele franziu a cara inteira, dizendo – Vadia pobrezinha! 

Não era uma coisa nem outra; apenas necessitada e remediada. Bem que ele podia ter pegado outra ricaça. Mas melhor que fui eu – pensava – caso fosse mesmo verdade, aquela conversa de Motel? 

Entraram no carro estacionado na Zona azul, já com um papel de multa preso ao pára-brisa, que ele arrancou de supetão – Não sou eu quem vai pagar mesmo! Estava deveras raivoso: roubara um carro, pensando em resolver as finanças e dera com os burros n’água. – Vadia pobrezinha!  Não cansava de repetir, esbaforido, trincando os dentes.

Partiram no sentido da BR. Ela dirigindo. Cuidava, no entanto, de não apertar muito o punhal apontado no baço dela – Vadia pobrezinha! Você vai vê!  Mandou virar o carro em direção ao primeiro Motel.

Agora, parecia mais nervoso que antes.  – E fique calada, que saí hoje da prisão, paguei a minha pena, e não quero matar ninguém e voltar pra lá.

Olhava insistentemente para o decote de sua blusa, imaginando ali aqueles peitinhos nus, onde logo, logo, estaria se deliciando. Mundo cruel, aquele lá da prisão – onde fora comido à revelia e a força; queria apagar, para sempre, aquela maldita verdade, de que por uns tempos, fora mulherzinha, daqueles imbecis!

Entraram no quarto e ele trancou a porta. E foi afastando do baço dela a ponta do punhal, ao tempo que lhe estocava as coxas com a outra arma, fálica, requentando-lhe a pele ardente. – Alto lá, cadê a camisinha? Você saiu da prisão, deve ter AIDS.

E não insista que não vou beijar nem abiscoitar, disse-lhe.

Ele retrucou – Vadia pobrezinha... Vai dizer que não tem camisinha aí nessa merda de bolsa?  Tinha.

Então, que ela mesma o vestisse, e rápido! Mas que fosse carinhosa, que o acariciasse ao menos de leve, sobre a camisinha. Mais tarde seria outra historia. Ela obedeceu – foi alem das suas expectativas – e esmerou-se nos afazeres.

Agora, era ela quem dava as ordens. Levou-o pra debaixo do chuveiro e o ensaboou por inteiro. E o massageou. Até que ele lançasse o pleno gozo, recheando a camisinha de um amarelo-escuro, decerto, o líquido enferrujado, entravado há tempo ali nos seus recintos.

Gritou. Ela pediu que ele não fizesse escândalo, que iam achar que estava morrendo. Que nada! Estava, de fato, era renascendo pra vida, lembrando as palavras do pai – macho de saco roxo! Coisa que o fizeram esquecer naqueles dias de prisão.

Ela o trouxe pra cama, depois de renovar-lhe o preservativo. Os dois totalmente nus. Agora, ela exigia que ele fosse também carinhoso; tinham a tarde inteira pela frente. E quem sabe, à noite toda? Ela gemeu alto. E ele pediu que não exagerasse nas emoções, que podiam desconfiar de coisas piores.

O que mais a excitava era saber que ele fora mulher de malandro. Virou-se de nádegas – por favor, querido: esconjure-se, afugente da memória esta maldita lembrança.

Era tudo o que ele queria. Era tudo o que ela precisava. E foi assim, um sem numero de vezes, até ambos caírem de lado, adormecidos. Já era noite e logo veio a madrugada.

Ela acordou, banhou-se, vestiu-se, maquiou-se, pegou a bolsa e partiu. Antes, deixou lá na cabeceira da cama, o dinheiro, que ela mesma havia sacado pra ele. Na portaria deixou um recado – Paguei as despesas com o cartão. Até outra vez...

O punhal, ela levou, cuidando de não apagar os vestígios das digitais dele. Era uma policial. Agora, ele estava em suas mãos, para quaisquer outras eventualidades – caso o namorado viesse e não desse no couro – o que era de se esperar... 

2 comentários:

  1. Pôxa, que conto legal! Gostei muito. Ótima narrativa, desfecho nota mil!
    Bjs
    Belvedere

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  2. Obrigado Belvedere, vivemos dessa lucidez - da sensibilidade do leitor, em entender o que tentamos transmitir. abrs. jairo

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